15 novembro 2006

A Espiritualidade no silêncio

Joerley Cruz

Pensar em espiritualidade significa abrir o leque para uma cosmovisão. Para muitos a espiritualidade está relacionada com o estado de espírito. Para outros, a espiritualidade possibilita um perfeito relacionar-se com o “eu” – uma experiência mística que nos auxilia em sermos melhores, mais úteis, mais produtivos, mais humanos, mais compreensivos, mais longânimos, pacientes, enfim, com tal espiritualidade e seus exercícios, tornamo-nos pessoas agradáveis e aceitas. Isso nos dá a entender que, por muitas vezes, a espiritualidade é sinônimo de uma busca insistente por domínio próprio, ou seja, domínio das situações da vida.
No entanto, podemos pensar em uma espiritualidade unicamente cristã.
É de se levar em consideração que espiritualidade é quando um ser imanente é alimentado por um ser transcendente, ou seja, em uma experiência espiritual, somos nutridos por alguém superior, perceptível, e pessoal; ou como escrevem Frei Betto e Leonardo Boff que, “espiritualidade é referida ao que não tem arrimo na vida material”.
Podemos caminhar na compreensão de que o Deus da Bíblia, o Deus presente no contexto judaico, que visita o ambiente cristão, ao mesmo tempo, é caracterizado como Espiritual.
A espiritualidade pode estar associada ao silêncio. Tal silêncio não se refere simplesmente numa omissão de palavras, mas na quietude de nosso espírito, que na maioria das vezes, se debate em diferentes direções. O silêncio confronta a ansiedade do ser – ansiedade essa que Jesus Cristo adverte que abandonemos. Jesus de Nazaré nos aconselha em não andarmos ansiosos por coisa alguma, ou seja, nossa quietude expressa o verdadeiro e desejado anseio com o qual, Deus espera com que nos ocupemos.
Associar a espiritualidade com o silêncio, ou seja, vivenciar nossas experiências com Deus, e em Deus, é perceber o teor de simplicidade em nosso relacionamento com o divino, e também profundo ao mesmo tempo. Não há nada mais simples que um estado de quietude. É possível que por isso, muitos não o busquem, uma vez que esses possuem a equivocada impressão de que tal espiritualidade conduza a um vazio desnecessário, inabitável, sem utilidade e proveito, não satisfazendo os anseios dos nossos dias.
A busca de uma espiritualidade sem reflexão, quietude, meditação, contemplação, nos conduz a um relacionamento raso com o Deus que é Espírito. Somos impulsionados a transitar por infinitos quilômetros superficiais, onde nossos olhos e percepção nos enganam, porém, possuímos uma profundidade de alguns poucos centímetros, que nos atraca e nos imobiliza.
O exercício do silêncio é calar-se diante do Espírito de Deus, dando assim, abertura à comunicação que Deus nos oferece. Falamos muito, opinamos muito, decidimos demais, cremos que sabemos todas as coisas, que possuímos as respostas para todas as situações, mas não silenciamos diante do Espírito divino.
O secularismo nos empurra para atitudes pró ativas. Atitudes que estejam presentes muito antes das reais expectativas, desprezando, assim, uma experiência onde Deus pode nos surpreender com Suas palavras e ações. Somos forçados a cada dia em não sermos espirituais, mas pragmáticos, realistas, onde muitos caracterizam, sutilmente, a atuação e manifestação do Espírito, como algo romantizado e emocional.
A espiritualidade no silêncio produz uma experiência aonde os gritos de muitas vozes, vindos por toda parte, sejam silenciados. Tal espiritualidade não nos anula na prática cristã, mas nos prepara para tal. Nossa quietude nos oferece proximidade de Deus, e conhecimento a respeito de nós mesmos, oferecendo uma melhor condição de convivência com o próximo. O sábio não é aquele que sabe todas as coisas a respeito dos outros e de tudo, mas aquele que, pelo menos um pouco, reconhece a si mesmo em uma busca constante.
Somos convidados por Deus em nos relacionarmos com Ele. Não estamos lidando com um Deus desvinculado de sua criação, nem muito menos de seus filhos. E nesse convite ao relacionamento, Deus espera de nós olhos e ouvidos dedicados e atentos a Ele, sem pressa, sem agitação, na desculpa de que temos muito por fazer por Ele, ou em favor do Reino, pois em tal desculpa, demonstramos tolice, devido às nossas falíveis, falsas e particulares motivações.
Em nossa prática espiritual silenciosa, ansiamos por uma formação progressiva de um caráter genuinamente cristão, altruísta, que compreende que a origem e o motivo de nossa prática, residem em um Ser que deseja nos moldar em semelhança de Seu Filho Jesus, que em sua quietude, tornou a vontade do Pai o seu alimento.

Um comentário:

Douglas Rodrigues disse...

Fui muito abençoado e edificado através desse texto, enfim.. Deus o usou para falar comigo.
Pois estou passando por um tempo em que Deus pediu pra que eu me retirasse de perto das pessoas e que ficasse em silêncio. Questionei muito, mas lendo esse texto, descobri um pouco do que me aguarda pra esse período de reflexão interior!!
Se puder, ore por mim!
Preciso!
Muito Obrigado!
Douglas Rodrigues
CTMDT